sábado, dezembro 30, 2017

Melhores Leituras em 2017: Cinco Romances e Cinco Contistas Nacionais


Pessoas Queridas,

Continuando na mesma tradição que motivou o post anterior, aqui vão os livros nacionais que mais me agradaram ao longo de 2017. Com um adendo: grande parte das minhas leituras de autores nacionais se deu por meio dos contos que publicaram na Amazon, alguns deles solo; então também vou citar alguns contistas que se destacaram, a meu ver, por diferentes razões. Vamos lá?



CINCO ROMANCES

O Segredo do Kelpie, de Aya Imaeda.

Esse livro conquistou meu coração desde as primeiras páginas. Aya Imaeda trabalha com uma criatura que eu nunca tinha visto aparecer em livros nacionais, e o faz com um à-vontade que deriva de uma excelente pesquisa. Combinada a uma grande habilidade para contar histórias, este romance para jovens e adultos vai proporcionar um inesquecível passeio pela Escócia do século XIX, com seus campos verdes, seu folclore – várias criaturas aparecem além do kelpie, todas elas apresentadas com mestria! -- e um punhado de escoceses teimosos e resmungões. Indicadíssimo!

O Romance do Horto, de António Corvo.

Os amantes da literatura medieval não podem perder este livro! Trata-se de uma história saborosíssima, que se entrelaça com várias narrativas daquela época – crônicas de reis, canções de gesta, coleções de contos como o Decamerão – e ecoa em outras, mais contemporâneas, tecendo uma trama rica e sofisticada. Não farei comparações com Umberto Eco nem com Saramago; o prazer que tive com este livro foi único, e eu o recomendo a quem quer que esteja disposto a desfrutar de uma boa história à moda das narrativas do medievo, sem pressa e com atenção.

Machamba, de Gisele Mirabai.

Só depois de ter lido e favoritado vim a perceber que esse e-book venceu o I Prêmio Kindle de Literatura. Trata-se da história de uma brasileira que reconstrói sua vida a partir de memórias fragmentadas – daqui veio a expressão que eu adorei e adotei, porque me traduz, muito bem, “cabeça de ovo mexido” –, e seu jeito de escrever também é cheio de idas e vindas, mas eu o achei muito hábil e envolvente. Recomendo.

Guanabara Real: a Alcova da Morte, de Nikelen Witter, Enéias Tavares e A. Z. Cordenonsi.

Esta é a primeira aventura de um trio de investigadores sui generis no Brasil do final do século XIX. O cenário e a trama são interessantes, mas o que achei mais legal foi a construção dos personagens. Os três protagonistas vêm de backgrounds complicados e são frequentemente marginalizados, por razões várias; a interação entre eles e com os personagens secundários, alguns dos quais também muito bem construídos, agrega profundidade ao livro e dá vontade de prosseguir com a série.

Os Vendilhões do Templo, de Moacyr Scliar

De vez em quando eu acho alguma coisa do Moacyr que ainda não tinha lido e corro para comprar. Este livro parte da conhecida história da expulsão dos vendilhões para compor três narrativas: uma do próprio episódio bíblico – e nessa, confesso, achei o texto um pouco tedioso, confuso – e duas outras, ótimas, ambientadas no território das Missões no século XVII e numa cidade gaúcha contemporânea. Moacyr Scliar é um dos meus autores preferidos e posso dizer que este livro, no geral, não me decepcionou nos dois quesitos básicos: entretenimento e pontos para reflexão. Vale a pena conhecer.

CINCO CONTISTAS

Em se tratando dos romances, falei sobre as obras. Agora falo dos contistas -- de algumas obras em especial, mas quase sempre do conjunto da obra de alguns autores (não que não haja muitos outros) que me chamaram atenção ao longo de 2017.


Cristiano Konno fez sua estreia na coletânea Samurais X Ninjas e vem crescendo a cada novo trabalho. É um prazer acompanhar sua evolução.

Sheila Lima Wing é autora do romance Louco Amor de Fã e de vários contos em que explora questões como aceitação, tolerância e empatia, tudo escrito de um jeito simples e muito hábil.

Renan Santos é outro que cresceu a olhos vistos, um jovem autor no qual devemos prestar muita atenção. Recomendo especialmente sua novela A Canção das Sereias.

Cláudia Dugim é talvez a voz mais diferenciada que tenho lido entre os contistas nacionais. O conto-título de O Desejo de Ser Como um Rio é magistral. Quem não tiver lido ainda, faça a si mesmo/a esse favor e adquira!

Camila Fernandes, autora já consagrada (e um tanto bissexta!), decidiu este ano lançar uma coletânea chamada Contos Sombrios, que eu considero imperdível para leitores de todos os gêneros literários e em especial do fantástico.

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Bom, pessoal, é isso. Obrigada por terem me acompanhado ou pelo menos visitado ao longo do ano. Espero que o próximo seja maravilhoso para todos, quer na Literatura, quer em outras atividades e na vida pessoal.

Abraços pra vocês e até 2018!

domingo, dezembro 24, 2017

Melhores Leituras em 2017 : Cinco Livros Estrangeiros

Pessoas Queridas,

Pensei por um longo tempo antes de escrever este post sobre as melhores leituras de 2017. Como eu já disse em uma postagem do Facebook, li muito pouca fantasia, e praticamente nenhum livro de fantasia épica. No entanto, tradição é tradição, literatura é literatura... por isso, para começar, aqui vão os cinco livros estrangeiros cuja leitura mais me intrigou, mexeu comigo ou simplesmente me deu prazer ao longo deste ano que termina.



The Animal Wife, de Elizabeth Marshall Thomas.

Embora as histórias sejam independentes, pode-se dizer que este livro é a continuação de A Lua da Rena (Reindeer Moon), um dos meus livros favoritos, que muito contribuiu para eu escrever histórias de xamãs e caçadores. O ponto de vista agora é de um rapaz, portanto vemos o lado masculino daquele universo rústico, pragmático, às vezes violento, em que a sobrevivência está sempre por um fio. Por outro lado, as relações familiares formam um mosaico intrincado e determinam boa parte das ações e decisões. O livro não foi traduzido aqui, comprei em e-book pela Amazon; não foi barato, mas valeu muitíssimo a pena.

Aproveito para deixar aqui um link para o meu artigo, bem antiguinho, sobre ficção pré-histórica. Isso se vocês ainda não viram. E outro fica aqui para o meu conto A Mãe da Montanha das Águias, escrito sob influência de A Lua da Rena. Ah, só um detalhe: A Montanha citada é o lugar onde, séculos mais tarde, construiriam o Castelo das Águias.

Os Pescadores, de Chigozie Obioma.

Em meio a um processo de eleição que poderia mudar o destino da Nigéria, quatro jovens irmãos desobedecem às ordens do pai e vão pescar no rio. Ao regressar, encontram um louco que faz uma profecia sombria acerca de um deles, o que interfere poderosamente em sua vida e em seu futuro. A história é narrada com força e sensibilidade, fazendo deste um livro que você não consegue largar até chegar ao final.

As Rãs, de Mo Yan.

Na China dos anos 1960, a política do filho único foi levada às últimas consequências, e os obstetras encarregados de trabalhar em uma região eram responsabilizados pelos nascimentos “fora da lei”. Este livro, em parte ficção histórica, em parte realismo mágico, narra as peripécias de uma delas sob o ponto de vista de seu sobrinho, que viu sua vida, a de sua família e amigos serem marcadas pelo radicalismo dessa medida.

Underground Railroad, de Colson Whitehead.

Cora é escrava numa fazenda do sul dos Estados Unidos. Ao conhecer Caesar, ele lhe conta sobre a rede de rotas clandestinas que ajuda escravos a fugirem para o Norte e para o Canadá, e os dois se lançam numa longa viagem cheia de percalços, conhecendo todo tipo de gente e tendo um vingativo caçador de escravos nos calcanhares. As imagens fortes, o ritmo de escrita e o interesse pelo assunto me fizeram ler esse livro de uma sentada.

A Língua dos Pássaros, de Stephen Kelman.

Narrado sob o ponto de vista de um menino africano, que vive em Londres com a mãe e a irmã mais velha, o livro gira em torno de um cotidiano escolar marcado pela atuação de gangues, pela competição, pelos delitos e por segredos às vezes perturbadores. Os toques ocasionais de humor e lirismo ganham sabor agridoce dentro do grande quadro. Recomendo!

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Bom, Pessoas... Foram esses os livros estrangeiros que mais me marcaram ao longo do ano. Volto depois do Natal para falar dos nacionais, onde vocês encontrarão, finalmente, alguns títulos de fantasia.

Desejo a todos bom período de festas, de encontros, de descanso.

Até breve!

domingo, dezembro 17, 2017

Vitória no Prêmio Argos 2017

Pessoas Queridas,

Ontem, dia 16, ocorreu a cerimônia de entrega do Prêmio Argos de Ficção Fantástica, promovida pelo Clube de Leitores de Ficção Científica. Foi a eleição com o maior número de votantes e eu fiquei entre os cinco finalistas das três categorias: romance, com A Fonte Âmbar, coletânea, com Medieval (que teve Eduardo Kasse como coorganizador) e conto, com o conto de Medieval, O Grande Livro do Fogo.

Eu até achava que poderia ganhar algum dos dois últimos, pois algumas pessoas me disseram que tinham votado em mim, e acompanhei a prévia. Só não esperava ganhar os Argos de coletânea E de conto, e ainda ficar em terceiro lugar na categoria romance. Foi uma emoção enorme, e eu só tenho a agradecer a todos que me apoiaram, leram, votaram e participaram de alguma forma para que isso fosse possível. Em especial ao Erick Santos, editor da Draco, ao meu parceiro Eduardo Kasse e a todos os demais autores de Medieval.

Com o vencedor da categoria romance, Alexey Dodsworth

O vídeo da cerimônia foi gentilmente disponibilizado pelo Eduardo Torres, do CLFC, e pode ser conferido aqui.

Para conhecer A Fonte Âmbar, ler a sinopse e algumas resenhas e conhecer o universo Athelgard, clique aqui

Para conhecer a coletânea Medieval, sua premissa, seus autores, clique aqui

Ilustração de Vilson Gonçalves para O Grande Livro do Fogo

Para saber um pouco mais sobre o conto vitorioso, seu processo de criação, influências e tudo mais, clique aqui.

No mais... Parabenizo a todos os indicados e deixo meu agradecimento a todos aqueles -- autores, editores, leitores, ilustradores, blogueiros, divulgadores -- que contribuem para o fortalecimento da Literatura Fantástica nacional.

quarta-feira, dezembro 06, 2017

Ana Merege e Eduardo Kasse na IV Feira Medieval Carioca - 9 e 10 de dezembro

Pessoas Queridas,

Dias 9 e 10 de dezembro, na Quinta da Boa Vista, vai rolar a IV Feira Medieval, com uma extensa programação voltada para quem curte aqueles tempos fantásticos. Vai ter comida, cerveja, hidromel, dança, arqueria, treino de espadas, venda de artefatos... E, claro, contadores de histórias, que no caso seremos eu e meu prezado amigo Eduardo Massami Kasse, autor da série Tempos de Sangue, que agora lança sua primeira HQ.


Esperamos vocês com nossos livros, marcadores, brindes, autógrafos e um papo legal. Em tempo: vai ter descontos sim! E aceitaremos cartão!

segunda-feira, dezembro 04, 2017

Evento de Fantasia Nacional - Imagens

Pessoas Queridas,

Estas são algumas imagens do evento que reuniu seis escritores de fantasia nacional (Cristina Pezel, Danilo Sarcinelli, Diogo Andrade, João Paulo Silveira, Rafael Cordeiro y yo) em Niterói, no dia 3 de dezembro. Contamos com a presença de Marco Aurélio Rocca para fazer um treino de espadas, para adultos e crianças, e da firma de camisetas Los Nerditos. O público foi maravilhoso.

Que venham mais eventos como esse em 2018! Salve a Literatura Fantástica Nacional!

Bate-papo sobre a Jornada do Herói

Nossa mesa de venda de livros. Ao fundo, Los Nerditos.

Mais uma imagem da palestra, tendo ao fundo os jogadores da Rolls n´Dice Coffee Tales.
A casa fica em Niterói e é o máximo para quem curte RPG e jogos de tabuleiro.

Marco Aurélio Rocca comanda um divertido treino de swordplay

domingo, novembro 26, 2017

Evento de Fantasia Nacional - Niterói, 3 de dezembro

Pessoas Queridas,

Venho convidá-los para este evento de que participo com vários outros escritores brasileiros de Fantasia. Sei que muitos moram longe, mas, se puderem ajudar com a divulgação, ficaremos muito felizes.

E quem for de lá ou de perto -- chega mais. Vai ser muito legal!

segunda-feira, novembro 06, 2017

"Magos" grátis no Kindle para Samsung



Pessoas Queridas,

Com orgulho e alegria, informo que, este mês, a coletânea "Magos", que organizei para a Editora Draco, está grátis para os usuários do Kindle para Samsung. São doze contos de autores de LitFan nacional, que abordam várias formas de Magia e escrevem em diferentes estilos.

No meu conto, "De Poder e de Sombras", Kieran, protagonista de "O Castelo das Águias" e dos livros seguintes, aparece quando jovem mago, um estudante veterano da Casa das Três Chaminés, que reúne os esquisitões na Escola de Magia de Riverast!

Para saber como baixar e ler sobre a coletânea, clique aqui!

quinta-feira, novembro 02, 2017

Coletânea Mitografias

Pessoas Queridas,

Como uma das várias novidades que eu espero trazer este mês, eis aqui a coletânea Mitografias, organizada pelo site do mesmo nome, para a qual tive o prazer e a honra de ser selecionada.


O tema devia ser "mitos modernos" e eu contei uma história passada no Rio de Janeiro contemporâneo. Nela, as Kothirat, deusas benfazejas da mitologia canaanita, vêm em socorro de Ana Maria, descendente de libaneses, e de seu marido, um imigrante sírio chamado Riad. Outros contos do livro trazem mitos astecas, indianos, brasileiros... Enfim, muita coisa legal!

O download é grátis, basta acessar a página clicando aqui.

Boa leitura!

quarta-feira, outubro 25, 2017

Um Recado para quem Estiver no Rio!




Pessoas Queridas,

Quem estiver no Rio entre 26 e 29 de outubro não deve deixar de visitar o estande da Draco na Primavera Literária, que este ano mudou de endereço: vai estar na Casa França-Brasil, um lugar ainda mais central, perto do Centro Cultural Banco do Brasil e de vários museus, sem falar na arquitetura carioca que é linda de morrer.

Por nossa vez, estaremos com todo o catálogo de livros e HQs, marcadores, sorrisos e, é claro, muitos e bons descontos!

Apareçam!

sexta-feira, outubro 06, 2017

Arquivo Lima Barreto Selecionado para o MoW

Pessoas Queridas,

É com prazer que informo que o Arquivo Lima Barreto agora faz parte do Programa Memória do Mundo - MoW da UNESCO.



Abaixo, o resumo da candidatura, elaborada por mim:

O Arquivo Lima Barreto é um conjunto composto por aproximadamente 1126 documentos compreendidos entre as datas 1892-1922, produzidos ou acumulados pelo escritor carioca Afonso Henriques de Lima Barreto. A tipologia inclui recortes de jornais, originais literários, anotações sobre literatura, material relativo à publicação de livros (contratos, recibos, faturas...), documentos pessoais e correspondência enviada e recebida pelo titular e terceiros. Entre os correspondentes encontram-se Monteiro Lobato, Olavo Bilac, Pascoal Carlos Magno, Carlos Sussekind de Mendonça, Herbert Moses, Mário Pederneiras, Francisco Schettino, entre outros nomes ligados às Letras e à atividade editorial. O arquivo inclui pelo menos uma crônica inédita (“Portugueses na África”) e os originais dos “Diários do Hospício”.

O arquivo é de grande interesse para os pesquisadores não apenas de Literatura Brasileira -- que aí encontrarão subsídios para analisar a obra de Lima Barreto e estabelecer edições críticas, além de compreender o panorama literário do Brasil nas primeiras décadas do século XX – como também para os cientistas sociais e historiadores, principalmente os que trabalham com questões ligadas às relações inter-raciais, visto ser Lima Barreto negro e de origem modesta, o que acarretou inúmeras implicações sociais e contribuiu para adiar seu reconhecimento como escritor.

domingo, outubro 01, 2017

Dragões

Pessoas Queridas,

O mês se inicia, e este vai ser bem agitado. Na blogosfera vamos ter postagens frequentes -- no blog do Castelo, espero que diárias -- e eu pretendo não deixar passar muito tempo entre uma e outra por aqui também.

Para começar, eis um texto sobre Dragões, que escrevi para a coletânea "Bestiário", organizada por mim e Ana Cristina Rodrigues para a Editora Ornitorrinco. Espero que gostem!




               O dragão é uma das criaturas mitológicas mais conhecidas em todo o mundo. As primeiras referências a ele provêm das civilizações do Crescente Fértil, como a Babilônia, onde aparece associado à deusa Tiamat. Na Índia, os Vedas, livros sagrados escritos há cerca de 3.500 anos, narram a vitória do deus solar Indra sobre um dragão-serpente de nome Vitra.
            Segundo a tradição chinesa, os dragões são seres celestiais, ligados ao equilíbrio entre os elementos. Simbolizam a honra, a sabedoria e o poder – não à toa, os imperadores se diziam seus descendentes – e ocupam um papel de destaque na cultura daquele povo. Esta exerceu grande influência em outros países do Extremo Oriente, como o Japão, a Coreia e o Vietnam, onde o mito se desenvolveu de acordo com  características próprias, diferentes daquelas que encontramos nos dragões ocidentais.
Na Europa, as representações mais antigas são datadas da Idade do Bronze, quando os dragões eram relacionados aos deuses e aos cultos da fertilidade. Da Grécia veio a palavra drákon, que significa tanto “dragão” como “grande serpente”. De fato, algumas criaturas mencionadas em lendas gregas são representadas ora de uma, ora de outra forma, como o dragão que vigia o tosão de ouro na lenda dos argonautas. Cila e Caríbedes, que guardavam um estreito marítimo, e a hidra derrotada por Hércules podiam aparecer como dragões ou como serpentes marinhas.
            A ideia que os ocidentais costumam fazer de um dragão se baseia sobretudo nos mitos nórdicos e anglo-saxões. Para esses povos, os dragões também estavam relacionados às forças da natureza. As sagas escandinavas falam de Jormungand, a serpente que envolve o mundo com seu corpo, enquanto as lendas de Beowulf e Siegfried mostram dragões em seu conhecido papel de guardiões de tesouros. Já nas lendas arturianas, o jovem Merlin escapa da morte ao revelar a existência de dois dragões sob o terreno onde o rei Vortigern pretendia construir sua fortaleza.
Talvez pela associação entre sua imagem e a da serpente, a Idade Média  enxergou no dragão uma criatura maléfica. Lendas cristãs mostram São Jorge e o arcanjo São Miguel derrotando dragões que simbolizam o demônio, antagonista das forças divinas. A literatura da época está repleta de histórias em que príncipes e heróis provam seu valor combatendo dragões, descritos como enormes lagartos cuspidores de fogo, cobertos de escamas e dotados de asas semelhantes às dos morcegos. A maioria tem quatro patas, embora existam muitas representações de wyverns, dragões com apenas duas patas traseiras além das asas. Tanto um como outro aparecem com frequência em brasões, escudos e bestiários.
Apesar da fama adquirida na Idade Média, o dragão não perdeu completamente suas qualidades de força e poder, que mais tarde seriam resgatadas pela literatura. Autores de fantasia – e não só – têm escrito sobre dragões sábios e justos, que se aliam aos humanos em combate contra as forças do Mal. E, nesse momento, mesmo os mais bondosos podem se mostrar guerreiros temíveis, capazes de vencer batalhas com um único jato de fogo.

Referências

HOULT, Janet. Dragons: their history and symbolism. Glastonbury: Gothic Image, 1987.
INGPEN, Robert, PAGE, Michael. Encyclopaedia of Things that Never Were. UK: Paper Tiger, 1985.
            Bestiário Online

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Não preciso dizer que existem dragões em várias de minhas histórias, mas sua participação maior se dá em duas noveletas:O Tesouro dos Mares Gelados e O Último Dragão de Athelgard.

quinta-feira, agosto 31, 2017

Editora Draco na Bienal 2017 : Ana Lúcia Merege estará nos dois sábados!



Pessoas Queridas,

Hoje começa a Bienal do Livro. Estaremos lá firmes e fortes, com todo o nosso catálogo de livros e HQs, brindes, descontos progressivos e a presença de vários autores, principalmente nos finais de semana.

Eu irei nos dois sábados, o dia todo, e estarei nos dois domingos de manhã, das 10 às 14 h.

Clique aqui para ver quando estarão os demais autores e apareça para um abraço, dois dedos de prosa e boa LitFan nacional!

segunda-feira, agosto 28, 2017

Magos: nova coletânea da Editora Draco


Pessoas Queridas,

Depois de um longo tempo de preparação, aqui está a mais nova coletânea organizada por mim para a Editora Draco. E ela tem um tema que eu, particularmente adoro: magos, xamãs e feiticeiros!

O livro traz doze contos, de gêneros que variam da fantasia urbana ao weird west, passando, é claro, pela fantasia épica com elfos e unicórnios. E onze autores e autoras maravilhosos embarcaram nessa aventura comigo, cada qual com seu estilo e sua história para contar: Eduardo Kasse, Simone Saueressig, Erick Santos Cardoso, Karen Alvares, Marcelo A. Galvão, Vivianne Fair, Eric Novello, Liège Báccaro Toledo, Charles Krüger, Melissa de Sá e Cirilo S. Lemos.

"Magos : histórias de feiticeiros e mestres do oculto" estará à venda na Bienal e pode ser encomendado em livrarias ou no site da editora. Basta clicar aqui.

Espero que vocês gostem. E, ah! Para quem curte o universo Athelgard ou quer conhecê-lo, é lá que se passa o meu conto!

segunda-feira, julho 31, 2017

A Era do Leonte : parte 3

-- Amigos... Olhem... Calma, por favor, tenham muita calma – disse Hanno, suando frio. – Eu vou embora, está bem? Vou só buscar minha avó e...
-- A avó – rosnou um dos nativos, deixando ver um par de presas crescentes, de tamanho respeitável. – Ele vai buscar a avó. Deixamos?
-- Deixamos. É a do cabelo branco, que falou com Halva – disse o outro.
-- Ah, Halva. Sim. Vá depressa, então – disse o das presas, brandindo a ferramenta. – Depressa!
-- Sim, eu... eu vou. Já estou indo. Até a vista! – exclamou Hanno, e se afastou a passos rápidos. Ganhou alguma distância antes de olhar por sobre o ombro e ver que outros nativos tinham saído da floresta e se juntado à dupla. Não o seguiram, mas ele podia sentir os olhares cada vez mais ameaçadores, e foi com o coração aos saltos que retomou o caminho do acampamento.
Um coro misto de balidos e ruídos guturais, que pareciam urros, chegou a seus ouvidos, vindo provavelmente da aldeia dos carsísios. Hanno apressou o passo, assustado, mas antes de mais nada preocupado com a segurança de sua avó. Para seu alívio, Elyssa surgiu logo adiante, acompanhada por Solônio, os dois parecendo tranquilos, alheios à nova sonoridade do cântico ou a qualquer mudança nos arredores.
— Ah, veja, aí está o rapaz! – exclamou Solônio. – Ele parece ter perdido a noção do tempo… ou será que o estava aproveitando com alguma garota?
— Se bem o conheço, aproveitou foi para tirar um cochilo – disse Elyssa.
Hanno olhou para o rosto da avó e enxergou além daquela expressão irônica: um brilho de triunfo nos olhos, sinal de que as coisas tinham ido bem, mas, ao mesmo tempo, uma apreensão traduzida pela boca contraída e pelas rugas na testa. Talvez houvesse notado alguma coisa. Ele ia contar o que descobrira e, sobretudo, alertar sobre o que acabara de ver, mas ela se antecipou, tomando seu braço e se dirigindo à trilha que ia dar no campo de pouso.
— Já achei meu neto, mas, por favor, acompanhe-nos um pouco mais – disse Elyssa a Solônio. – Explique a ele os termos do acordo que acabamos de firmar.
— Firmou o acordo com a Caríbdes? – surpreendeu-se Hanno. – Mas… deve ter sido com outro valor, certamente…
— Um crédito equivalente a mil e trezentos talentos de prata em favor da Liga Mercantil de Medistelara. O Comandante já expediu a ordem, e de qualquer forma tenho as cópias assinadas e seladas do acordo formal. O pagamento está garantido, haja o que houver.
— E o acordo sofreu uma pequena modificação – disse Solônio, que não prestara atenção à última frase. – A Liga Mercantil se compromete a não iniciar qualquer exploração em Carsis ou negócios com os nativos durante oito anos – um pouco menos do que nós queríamos, mas é aceitável –, e sua avó pediu a inclusão de uma cláusula segundo a qual essa parte do acordo será anulada se a Caríbdes se retirar do planeta sem deixar nenhum representante. Ou seja, se ela abandonar o empreendimento.
— E vocês aceitaram essa cláusula? – indagou Hanno.
— Sim, porque essa situação é altamente improvável. Diria quase impossível, tendo em vista que somos heládicos, insistimos e lutamos até o fim. Sua avó pensa em termos ken´ami, calculando o lucro imediato e o caminho mais fácil. Se me perdoam a franqueza.
— Ah, é claro que perdoamos. Vocês são os heróis do Aglomerado – disse Elysa, ácida. – Mas isso não significa que não tenhamos qualidades.
— Oh, não, não, não! Pelo contrário! A senhora mesmo, conseguindo cem talentos a mais, a redução no prazo de exclusividade… Confesso que não esperava que o comandante fosse aceitar.
— E, mesmo assim, ele riu quando pedi a cláusula. Pois bem, senhor mestre de leis. – Deteve-se, já diante do campo de pouso, onde podiam avistar a Balthazar-5. – Antes de nos despedirmos, ouça a voz da experiência e não desfaça aquela sua mala. Nunca se sabe quando será preciso viajar de repente.
O heládico piscou, sem entender, mas agradeceu o conselho. Um novo coro de urros e balidos soou ao longe, e com isso os dois ken´ami se apressaram a se despedir e a rumar para a nave, cuja rampa de embarque já tinha sido baixada para recebê-los.
— Tudo certo – disse Elyssa, dirigindo-se aos tripulantes na ponte de comando. – Podemos nos preparar para entrar em órbita. Ah, e assim que possível enviem uma mensagem ao escritório central da Liga para confirmar a entrada de um crédito em nossos cofres. Mil e trezentos talentos de prata.
— Bom, agora você vai fazer o favor de me explicar tudo – Hanno desabafou, retendo-a pelo braço. – Já tinha feito os cálculos, é isso? Tive trabalho à toa?
— Hanno, Hanno… Tenha calma, menino. Deixe sua avó descansar. – Sentou-se numa poltrona giratória e abriu uma bebida energética feita de tâmaras. – Eu tinha lido os relatos nos Anais da Liga. Sabia da existência das eras astronômicas. Mas só quando íamos para o acampamento e vimos o calendário no marco de pedra é que notei uma discrepância, que me fez pensar num lapso de alguns dias entre um e outro período.
— E, já naquele momento, concluiu que haveria uma Era do Leonte? – insistiu Hanno.
— Bom, a posição deste planeta sugeria que o Leonte poderia ser visível nesta época, mas eu não tinha certeza, nem sabia se os nativos iriam considerar esses dias como uma Era. Fico feliz que você tenha chegado a essa conclusão – acrescentou, com orgulho —, porque, se a sacerdotisa não houvesse me explicado tudo, seus cálculos seriam fundamentais para confirmar minha teoria.
— Sacerdotisa? Halva? Como você sabia…?
— Ah, uma mulher de idade com um colar daqueles devia ter algum poder, ao menos conhecimento. Eu perguntei diretamente, e ela não teve receio de me contar, pois viu que não concordo com as maneiras daquele Comandante. A Era do Árion termina em algumas horas, e entra a do Leonte, quando os nativos vão rugir e mostrar as garras. Alguns já devem estar começando, aliás – os mais jovens e sensíveis, segundo disse Halva. Logo, a transformação vai se estender a todos, e eles vão pôr fim à tirania dos heládicos.
— Pôr fim? Então eles pretendem…? – Hanno deixou a pergunta no ar.
— O quê, matá-los? Em princípio não, porque eles mudam de temperamento, mas não perdem a consciência. Mesmo agressivos, serão capazes de falar e esperar algumas horas até que os heládicos se retirem de Carsis; é o que vão exigir, e não tenho dúvidas de que conseguirão.
-- Será? Os heládicos têm militares com eles, devem ter muitas armas...
-- É verdade, mas já faz um bom tempo que os carsísios vêm se preparando para a nova Era. Árions são mansos, mas não são tolos! Como serviçais, eles têm acesso ao acampamento e até ao Bucéfalo – e nestes últimos dias, sem que os heládicos percebessem, neutralizaram todas as armas e acabaram com seu poder de fogo. E eles são centenas, contra umas duas dezenas de engenheiros e militares. A Caríbdes não terá alternativa a não ser dar o fora, e eis o porquê de eu pedir a inclusão daquela cláusula no contrato.
— Para que nós, passados esses dias…
— Você não sabe mais terminar as frases? Mas sim, é isso mesmo, Hanno. Eles vão abandonar o empreendimento – sorriu Elyssa. -- E isso, segundo o contrato, equivale a abrir mão da exclusividade e da preferência.
— E aí vamos ficar orbitando o planeta, esperando que acabe a Era do Leonte – resmungou o rapaz. – E então vai ser a nossa vez de explorar os nativos.
Explorar? Esqueceu que eles mudam de comportamento de acordo com as Eras? Com o Leonte seria perigoso até chegar perto, por isso vamos ficar uns dez dias em órbita. Quando voltarmos a Carsis, encontraremos os nativos na Era do Táurio, e Halva deixou bem claro que o negócio se dará em outros termos. Eles vão ser nossos sócios, não subalternos. E a extração do deltrílio vai ser feita pelo processo ken´ami. É menos agressivo ao meio ambiente que o heládico… ou, pelo menos, é o que ensinam na escola.
Hanno a encarou com assombro e um respeito crescente. Sua avó não conseguira apenas uma compensação financeira – se fosse isso, ela jamais aceitaria tão pouco – e sim a perspectiva de um excelente empreendimento para a Liga Mercantil. Isso já bastaria para admirá-la, contudo havia mais. Ela entendera a visão dos nativos e planejara tudo de acordo com seu tempo. Agira, e agiria rigorosamente dentro do acordo, de forma que não caberiam reivindicações por parte dos heládicos. E tanto os carsísios quanto os ken´ami sairiam ganhando.
Sim, vovó. – Elyssa franziu a testa: Hanno costumava chamá-la pelo nome. – Sobre a extração, eu aprendi na escola. Sobre o espaço e como navegar, aprendo com os mestres da Liga. Mas tenho que confessar… Há coisas que só aprendo com você.
O rosto da matriarca se enrugou num raro sorriso aberto. Hanno deslizou a mão por seus cabelos curtos e brancos, depois a pousou no seu ombro, e os dois ficaram lado a lado, em silêncio, observando o espaço pela escotilha.
A mesma pela qual, dentro de poucas horas, veriam passar a Bucéfalo a toda velocidade, movida pelo último deltrílio que os heládicos tinham extraído de Carsis.

Parte 1
Parte 2

sábado, julho 29, 2017

A Era do Leonte : parte 2

— Ajude a senhora, Hanno – ordenou a matriarca. – Quanto ao senhor, deveria moderar o tom. Os carsísios não são seus escravos, e, ainda que fossem, isso foi inteiramente fora de propósito.
— Não são escravos – concordou Agapipókias –, mas trabalham para a Companhia e só entendem as coisas no grito. Se não for assim, vão fazendo do jeito deles, com desleixo, apesar da mansidão. Mas estão melhorando, é verdade. – Pegou o primeiro copo de vinho servido por Hanno. – Quando chegamos era bem pior. Era uma lerdeza, um desânimo que dava até raiva. Todos andavam feito uns velhos, com a cabeça caída para a frente, e ainda tinham aquela mania de ficar enfiados em casa boa parte do dia. Agora trabalham com mais vontade.
— Claro – acudiu Solônio –, porque, se não, como ganhariam ferramentas e coisas bonitas? Não é mesmo, Halva?
Forçou um sorriso cheio de dentes para a mulher com a bandeja. Ela retribuiu com outro, dócil e cansado. Em seu pescoço brilhava um pingente composto por três pequenos discos, sendo o maior uma lasca de pedra polida, o segundo de cristal transparente e o terceiro de ouro. Hanno, de pé a seu lado, teve uma estranha sensação ao perceber como os três círculos se sobrepunham, lembrando a inscrição que tinham visto no marco de pedra, à beira da floresta.
Enquanto ele refletia, o Comandante Agapipókias deu início ao que chamava de “ir direto ao ponto”. Do seu pad dourado ele projetou uma tela holográfica, pela qual fez passar algumas imagens em rápida sucessão: o registro da chegada dos heládicos e da montagem do acampamento, as primeiras perfurações da montanha, pilhas de deltrílio extraído sendo levadas para os cargueiros. Os carsísios apareciam em várias imagens, no início parecendo lentos e apáticos, depois mais decididos, mas tudo dentro daquele jeito manso. Agapipókias mostrou também os números do empreendimento, a quanto montavam as despesas e quão baixos, segundo ele, ainda eram os lucros com a venda do excedente. Feito isso, foi a vez de Solônio entrar em ação, lembrando a vocação dos ken´ami para as viagens e o comércio, e como fariam melhor em levar seus excelentes pilotos e veículos a desbravar rotas desconhecidas. Teriam até um incentivo dos heládicos, se Elyssa, em nome da Liga, abrisse mão de explorar as minas de Carsis pelos próximos dez anos.
— Depois disso, com a expansão do negócio, talvez possamos discutir uma parceria comercial – disse o mestre das leis, todo sorrisos. – Até lá, oferecemos um crédito equivalente a mil talentos de prata.
— Mil talentos por ano, durante dez anos? – indagou Elyssa.
— Nnnn… não, minha senhora. – Solônio sorriu amarelo. – Por todo o período em que valer o acordo.
— Então é um valor ridículo!  – exclamou Hanno, indignado. – Vocês tiram isso desta mina a cada dois meses!
— Sim, mas e as despesas? E o investimento? – lembrou o homem das leis. – O que os ken´ami teriam de gastar para estabelecer uma concorrência? Isso, é claro, sem falar no desgaste político, nas relações entre Qartag e as cidades heládicas. Elas sofreriam um abalo se…
Nesse momento, um som melancólico, produzido por várias vozes, se fez ouvir ao longe. Parecia um cântico, mas sem palavras, apenas a repetição sincopada de aaaaas e eeeeees. Hanno ia perguntar o que era aquilo quando Halva, a nativa que trouxera o vinho, se pôs subitamente a vocalizar junto com os outros em alto e bom som.
— E isso, agora! Saia já daqui, mulher! – berrou Agapipókias, levando as mãos aos ouvidos. Halva obedeceu, mas, uma vez lá fora, prosseguiu com o cântico, que soava quase exatamente como um balido de árion. Ou melhor, de centenas de árions. Todos os nativos de Carsis num raio de vários estádios.
— Viram só? Eles fazem isso todos os dias, três vezes por dia. Começaram tão logo acabou aquele costume de ficar trancados em casa. Vocês não vão querer passar por isso – afirmou Solônio.
— Então eles imitam árions, não é? Deve ser… a religião deles. – Elyssa lançou ao neto um olhar penetrante.
— Sei lá! Nós perguntamos, mas eles não quiseram falar. Também não vimos templos, nem sacerdotes, nem qualquer tipo de culto a não ser esse coro de balidos. Os Anais da Liga Mercantil não dizem nada sobre isso? – indagou Akapipókias. – Quando os primeiros ken´ami vieram a Carsis, sabe…
— Não. Os relatos contam de um povo muito espiritualizado, com pouco interesse em bens materiais, que vivia à beira-mar e dali tirava o sustento.
— À beira-mar? Então eles se mudaram em massa para o interior? Já estavam aqui, nas suas malditas casinholas, quando chegamos…
— Pois é. Não sei o que pode ter acontecido – respondeu Elyssa.
Seu tom de voz fez Hanno ter certeza de que ela sabia. Os heládicos deixaram de lado a questão dos nativos e prosseguiram com as explicações, tentando convencê-la das vantagens de assinar o acordo e até insinuando a possibilidade de uma quantia passada diretamente às mãos de Elyssa, à parte dos mil talentos oficiais. Ela deixou claro que não aceitaria suborno. A proposta se elevou a mil e duzentos talentos. Para o espanto de Hanno, a avó deu mostras de estar disposta a considerar, ao mesmo tempo que pedia uma pausa, alegando cansaço.
— A idade requer cuidados, vocês entendem. – Elyssa tinha mais fôlego e resistência que Hanno e uma saúde de ferro. – Se houvesse um lugar para esticar os ossos…
— Claro, claro – concordou Solônio. – Venha comigo, vou levá-la a uma tenda onde poderá repousar.
— Meu neto também deve estar cansado de ficar em pé – disse Elyssa.
— Ah, sim, sim, é claro. Que descortesia. O rapaz pode acompanhá-la, e haverá um banco para ele quando voltar.
— Não demorem – rosnou o comandante.
Hanno e Elyssa seguiram o mestre de leis até uma tenda no extremo do acampamento. Talvez fosse a do próprio Solônio, que chegara uns dias antes, no último cargueiro a pousar em Carsis. A cama parecia nova, e ao lado havia uma mala de viagem com fechos reluzentes. Elyssa se estirou na cama, enquanto Hanno se sentava num banco dobrável a seu lado, curioso para saber onde ia dar aquela manobra de sua avó.
— Precisa de mais alguma coisa? – indagou Solônio.
— Massagem nos pés – respondeu Elyssa, sem hesitar; o heládico estremeceu, e ela prosseguiu em tom natural. – Mas não vou pedir isso a você, que deve ter muitos afazeres. E Hanno é um desajeitado. Pode chamar aquela mulher que serviu o vinho? Ela parece tão gentil…
— Ah, isso é mesmo. Os nativos são boas pessoas, apesar de simplórios. É uma de nossas metas integrá-los à cultura heládica, à verdadeira civilização.
— Perfeito. Podem começar por ensiná-los a ler – disse Elyssa, e Hanno reprimiu um sorriso: o alfabeto heládico derivava da escrita ken´ami. Solônio, porém, não percebeu a ironia e saiu todo feliz para chamar a carsísia. Foi então que os dedos de Elyssa se fecharam sobre o braço do neto.
— Escute, Hanno, este é o momento em que você vai ter que honrar sua medalha de primeiro da turma. Está com o Atlas Estelar Avançado aí nos seus arquivos, não está? E os Anais da Liga Mercantil?
— Sempre. – Ele bateu no peito, onde um bolso interno guardava o pad carregado de livros e textos sobre navegação.
— Ótimo. Você precisa consultá-los e fazer uns cálculos, mas não aqui, não quero que o vejam mexer nesse material. Vá até o marco de pedra pelo qual passamos, você já sabe o que ele é, não sabe?
— Um… mapa celeste?
Mapa? Começo a achar que deveria ter trazido seu primo Himilco, e não você. Mapa, tem certeza? Com todas aquelas marcas que havia ao redor do círculo? Para que acha que elas servem?
— Poderia ser para… Já sei! – ele exclamou, encantado com a súbita compreensão. – As linhas marcam a passagem do tempo. Aquilo é um calendário!
— Muito bem. – Tornou a apertar seu braço, a ênfase na voz. – Saia daqui discretamente e vá até o marco de pedra. Não deixe que ninguém o acompanhe. Compare as marcas no calendário com o movimento de Carsis e de suas luas, que vai encontrar no Atlas, e tente descobrir quando eles mudam de fase, de era, ou como quer que chamem este período. Tente saber o que vem depois e quanto tempo irá durar. Eu tenho uma suspeita e vou tentar confirmá-la com a nativa, mas, se não conseguir, seus cálculos podem…
— Pronto, aqui está ela! – anunciou Solônio, entrando na tenda. Halva estava atrás, com a expressão parada de antes, mas o andar parecia mais decidido. Seus olhos tiveram um lampejo de reconhecimento ao ver Elyssa. Tomara que isso ajude, pensou Hanno.
— Vou dar uma volta por aí, tudo bem? – perguntou ele a Solônio. – Não preciso assistir à sessão de massagem da minha avó.
— Claro, pode ficar à vontade. – O heládico saiu com ele, deixando as mulheres na tenda. – A aldeia dos nativos fica depois da mina, mas, seguindo a trilha a partir daquelas árvores, você chega a um rio onde as garotas costumam lavar roupa. Se estiver com sorte, vai encontrar alguma por lá. Quem sabe também consegue uma massagem, hem, garotão?
Deu uma cotovelada cúmplice no braço de Hanno. Desconcertado, mesmo assim o rapaz assentiu: de certa forma, aquilo lhe fornecia um álibi. Ele se apressou a seguir a trilha que levava ao rio e, tão logo se encontrou longe das vistas dos heládicos, deu a volta pelas árvores, seu instinto de navegador o ajudando a localizar o marco de pedra, onde estava o calendário. Usou um dispositivo em seu pad para conseguir imagens de vários ângulos e se afastou, seguindo outra vez em direção ao rio, onde sua presença despertaria menos suspeita.
Quando pôde ouvir o barulho da água, ele se sentou numa pedra chata e acionou a biblioteca do pad, ao mesmo tempo que projetava as imagens do marco diante de seus olhos. Elyssa tinha razão, aquilo só podia ser um calendário, embora Hanno ainda não soubesse como os carsísios mediam o tempo. Tinha a ver com constelações, aquilo estava claro, mas em relação a quê? Ao Sol? A uma das luas? Ele consultou os dados contidos no Atlas Estelar, puxou uma nova tela e desenhou projeções, testando possibilidades, até encontrar um padrão que parecesse plausível. Então, lembrou-se de consultar os Anais da Liga Mercantil, onde os primeiros ken´ami a comerciar em Carsis tinham dito que

De acordo com suas crenças, os carsísios adotam o comportamento que julgam adequado à era astronômica corrente. Neste momento, a constelação mais brilhante no céu é a do Delfino – e eles adotaram um andar ondulante, ergueram casas perto do mar e abandonaram qualquer luxo ou tecnologia desnecessária à subsistência. Os delfinos são seres muito espirituais, conforme nos explicou o sacerdote.
É curioso ver como os carsísios se adaptaram tão bem à nova vida, mas para nós, no que toca aos negócios, é a certeza de uma perda ou ao menos adiamento. A presente era vai durar mais vinte anos, e depois virá a do Quelonídeo, quando todos ficarão o máximo possível dentro de seus cascos, ou seja, de suas casas...

Hanno interrompeu a leitura, estarrecido. Ali estava a explicação, bem debaixo do seu nariz. Também estivera diante dos heládicos, que não dispunham dos Anais da Liga, mas poderiam ter feito os cálculos, ter feito mais perguntas aos nativos, ter chegado às suas próprias conclusões. Em vez disso, haviam se estabelecido em Carsis no final da Era do Quelonídeo e se julgavam responsáveis pelo novo comportamento dos carsísios, agora mais propensos ao trabalho duro, só desobedecendo às suas ordens quando se uniam em um novo cântico ritual.
O balido do árion. Essa era a fase atual – e Hanno devia descobrir quando terminava. Ele se concentrou nos círculos, jogando constelações na tela e traçando órbitas planetárias, e trabalhou as imagens do calendário, fazendo simulações que levassem em conta a posição das luas. Conhecendo sua avó, não foi uma surpresa concluir que a Era do Árion se encerraria, muito oportunamente, no decorrer de sua visita a Carsis – mas o que ele não entendia era o lapso de tempo, cerca de quatro ou cinco dias, antes que o calendário entrasse na Era seguinte.
O aprendiz repassou os cálculos em busca de erros. Era isso mesmo, a marcha do planeta ia deixando Árion para trás, e em seguida surgia Táurion, que reinaria durante cerca de quinze anos, mas o calendário de fato apresentava uma falha. O que seriam esses dias vazios? Hanno ampliou as imagens que trouxera do marco de pedra e analisou cada detalhe; e então seus olhos de repente se estreitaram, o coração batendo forte ao perceber a pequena constelação, formada por apenas cinco estrelas, como o único ponto brilhante naquele período de tempo.
— Leonte – murmurou, fechando as telas abertas e se levantando de um salto. – Preciso avisar…
-- Aaaaaahrghh! Ali! – exclamou, ou melhor, rugiu alguém às suas costas.
O rapaz se virou, alarmado, e o que viu o fez recuar sobre os próprios passos: dois carsísios adultos, segurando ferramentas de mineiro, olhando-o com as caras fechadas e os olhos injetados. Ainda se continham, mas suas expressões tinham perdido toda a docilidade e se tornado quase selvagens.
Bem como se esperaria do que estava por vir.

(Continua...)

Parte 1
Parte 3

quinta-feira, julho 27, 2017

A Era do Leonte : parte 1

Pessoas queridas, chegamos ao último conto da série! Nele é apresentado um universo que vocês ainda não conhecem, partilhado com meu amigo Luiz Felipe Vasques: Medistelara, no qual as civilizações do antigo Mediterrâneo são transportadas para o espaço. Temos aquilaces imperialistas, khemitas cheios de dignidade, heládicos heroicos e, claro... ken´amis comerciando pelas galáxias afora em nome da Liga Mercantil de Medistelara, que é controlada por eles.
O primeiro conto que escrevemos (a quatro mãos) deve sair em breve numa coletânea de Space Opera. Este, escrito apenas por mim, é uma prequel em que  o futuro navegador ken´ami Hanno é um adolescente viajando com sua avó, a poderosa Elyssa de Qartag, a fim de selar um acordo de negócios num planeta distante... e num momento especial. Espero que gostem.
A ilustração é do talentoso Valdir Muniz.



***

— Então, chegamos ao famoso planeta Carsis. Não entendo por que temos de abrir mão dele – comentou Hanno, olhando em volta. – Além do minério, tem essa floresta densa, como já quase não existe em Medistelara. E o ar é puro. Eu estou gostando do lugar.
Alto e forte para os seus quinze anos, barba despontando no queixo e usando com orgulho seu distintivo de piloto aprendiz, o rapaz acompanhava os passos ligeiros da avó, que se dirigia ao acampamento dos heládicos. Ia negociar uma compensação a ser paga pela Companhia de Mineração Caríbdes, que se estabelecera sorrateiramente em Carsis e começara a explorar as minas de deltrílio. Sua alegação era de que os ken´ami, que tinham iniciado as trocas comerciais com os nativos cerca de trinta anos antes, não haviam se interessado em ir além, e o deltrílio permanecera todo esse tempo no interior das montanhas, à espera de quem o extraísse e lhe desse bom uso. Jamais pertencera de fato aos ken´ami, ou, mais propriamente, ao governo de Qartag, a mais forte das cidades fundadas por aquele povo de navegadores e comerciantes. Ainda assim, reconhecendo que o fato de ter chegado primeiro a Carsis lhes concedia a preferência, a Caríbdes se dissera disposta a compensar os qartagineses, fosse em dinheiro sonante ou com uma fração do que obtivessem nas minas.
E, para tratar disso, ali estava Elyssa de Qartag.
O olhar de Hanno envolveu sua avó num misto de amor, admiração e um pouco de exasperação pelos modos dela. Matriarca da família, membro do alto escalão da Liga Mercantil de Medistelara – dominada pelos ken´ami, que a tinham fundado, mas que congregava comerciantes de todos os povos e pontos do Aglomerado –, Elyssa era uma mulher baixinha e enérgica, de cabelos brancos, língua afiada e olhos penetrantes aos quais não escapava o menor detalhe. No curto percurso entre o campo de pouso onde ficara sua nave, a Balthazar-5, e o acampamento dos mineradores, ela se detivera várias vezes para analisar o entorno – mata virgem, praticamente intocada, exceto por aquela trilha aberta pelos heládicos – e para observar, sem disfarce, cada nativo que cruzava o seu caminho.
Os carsísios eram humanoides de pele levemente acinzentada. Tinham estatura média pelos padrões de Qartag e costumavam ser robustos, com braços fortes que terminavam em mãos de quatro dedos. Eram também extremamente dóceis e tímidos, andavam de cabeça baixa e pediam desculpas por tudo. Os relatos dos primeiros ken´ami a travar contato com eles falavam de uma cultura elaborada, com rituais cheios de simbolismo, mas poucos avanços no campo da tecnologia. Sabiam, fazia tempo, que seu deltrílio era valioso para a indústria espacial, mas não tinham procurado desenvolver ferramentas adequadas para a extração. Em vez disso, vendiam sua força de trabalho na mina – já que nem todas as atividades eram automatizadas – e cuidavam da logística, limpando, servindo, fornecendo comida e o que mais fosse necessário. Estavam felizes com isso, segundo os heládicos, mas o que Hanno via em seus rostos, mesmo de relance, não era bem alegria. Era apenas a resignação de quem escolhe o menor dos males.
— Ainda acho que você devia recusar a oferta, seja qual for. – Hanno alcançou a avó, que tinha parado mais uma vez e examinava a inscrição num marco de pedra à margem da trilha. – Este não é território dos heládicos. Deveria ser nosso, e as minas deveriam ser exploradas pelo processo ken´ami. É mais eficaz, menos danoso ao meio ambiente e…
— Aprendeu isso na escola? – Elyssa perguntou, com a ironia habitual. – Exploração é exploração, menino. Causa danos, sempre. Esse ideal que nos incutem quando jovens pilotos, descobrir rotas intocadas, ir aonde ninguém foi, tudo isso é muito bonito, mas esbarra na lógica do comerciante. Para quem você trabalha?
— Para a Liga Mercantil de Medistelara – ele suspirou.
— Exatamente. Uma liga de comércio – tornou a avó. – Para ela, o que interessa não é o que causa menos danos, e sim o que traz mais lucros. Se a compensação oferecida pela Caríbdes for boa o bastante, vou aceitar, e ponto final. Entendido?
Hanno fez que sim, num silêncio amuado. Compreendia o raciocínio de Elyssa, típico de comerciante e de ken´ami, mas o que tinha isso a ver com seu desejo de descobrir novos caminhos? E se os pilotos da Liga tinham incluído aquele planeta na rota de comércio, deviam deixar que os nativos fossem explorados? Ele olhou para os trabalhadores que vinham no sentido oposto, saindo da mina após um turno de várias horas, e se culpou por aqueles rostos cansados e costas curvadas. Eles estariam bem melhor se o deltrílio fosse explorado com tecnologia ken´ami. Mas ali estava sua avó, falando em nome de outros velhos, para defender o lucro acima de tudo.
— Então, vamos? – perguntou ele, querendo acabar logo com aquilo. – O acampamento da Caríbdes fica ali adiante.
— Só mais um momento. Olhe essas inscrições. – Ela apontou para o marco de pedra, onde estavam esculpidos três círculos concêntricos em baixo relevo. – Veja as figuras espalhadas dentro dos círculos. Um delfino, um quelonídeo, um árion…
— Sim, e daí?
— Pense um pouco – replicou Elyssa. – Isso não lembra alguma coisa?
— Hum. – Ele olhou para as imagens, consultou a memória, e no instante seguinte a luz se fez. – Ah, mas é claro! São as constelações que eles veem a olho nu! Mas então… isso seria um mapa celeste? Aqui, no meio de uma trilha na floresta?
— Eu também achei curioso, mas deve fazer sentido. – Elyssa tocou algumas marcas em torno dos círculos, simples arranhões que pareciam ter sido feitos mais tarde. – Bom, depois voltamos a isso. Agora, vamos, o pessoal da Caríbdes já deve estar impaciente.
Hanno assentiu, e os dois se apressaram pelo que restava do caminho. O acampamento heládico surgiu logo depois: um conjunto de tendas de tecido sintético, do tipo mais utilizado em expedições e campanhas militares, montadas ao redor da Bucéfalo, a grande nave de formato abaulado que trouxera a Carsis os engenheiros e prospectores. O maquinário vinha em cargueiros que também levavam embora o deltrílio extraído, mas no momento não havia nenhum à vista. Quanto à mina, ficava a alguns estádios de distância, perto o bastante para que os heládicos pudessem supervisionar os trabalhos, mas longe o suficiente para que o barulho e a poeira não os incomodassem quando estavam no acampamento.
— Salve, Senhora Elyssa, porta-voz da Liga Mercantil! – Solônio de Cenos, o jovial mestre de leis contratado pela Caríbdes, se adiantou para recebê-los. – Estávamos ansiosos à sua espera. Fez boa viagem? Precisa de alguma coisa, algum suprimento, algum reparo em sua nave? Posso mandar providenciar enquanto conversamos, assim não ficará retida em Carsis mais tempo que o necessário.
— Ora, ora – fez Elyssa, sorrindo com ironia. – Não sabia que tinham toda essa pressa em me ver pelas costas.
— O quê? Oh, não, não, não! – O homenzinho quase engasgou. – De jeito nenhum, senhora! É bem-vinda para ficar em Carsis enquanto assim desejar! Eu apenas supus que uma pessoa na sua posição fosse muito ocupada… Que não quisesse permanecer aqui mais tempo que o necessário para fechar o acordo. Porque, olhe, não tenho a menor dúvida de que chegaremos bem rápido a um entendimento. A Companhia deseja que suas relações com a Liga Mercantil se mantenham harmoniosas, transparentes, e que haja proveito para ambas as partes. Venham, o Comandante Agapipókias vai recebê-los.
— Comandante? – Hanno sussurrou para a avó. – Não deveríamos falar com um representante da Caríbdes?
— Deve ser isso mesmo. O deltrílio tem uso militar, portanto o exército deles está metido na história – soprou Elyssa de volta.
Hanno fez que entendia e ficou em silêncio. Os dois seguiram o saltitante mestre de leis até uma tenda aberta, onde um homenzarrão de cabelo comprido, vestindo um uniforme escuro, equilibrava seu amplo traseiro num banquinho.
— É ela? – perguntou ele a Solônio, ignorando os recém-chegados.
— Sim, meu comandante, esta é a famosa Elyssa de Qartag. O rapazinho é…  bem, ela não disse. Um secretário, talvez?
— É meu neto mais velho, Hanno – rosnou Elyssa. – Piloto aprendiz da Liga Mercantil.
— Aqui não é lugar para aprendizes – Agapipókias rosnou mais alto.
Elyssa parou diante dele, braços cruzados, os dois medindo um ao outro com o olhar. Então, de má vontade, o heládico apontou o banquinho à sua frente.
— Sente-se aí – disse ele. – Eu iria direto ao ponto, mas meus superiores ordenaram que lhe mostrasse imagens da mina e repassasse alguns dados antes de falarmos do que interessa. Pura formalidade.
— Às vezes é inevitável – retrucou Elyssa.
Nesse momento, dois carsísios surgiram carregando uma mesa dobrável, que montaram no espaço entre o comandante e os dois ken´ami. Feito isso, recuaram, murmurando desculpas pelo incômodo, e uma nativa mais velha entrou com uma bandeja onde estavam copos e uma jarra de cerâmica. Ia pousá-la sobre a mesa quando um rugido de Agapipókias a fez recuar.
— Tenha cuidado, mulher! Você vai pagar caro se derramar uma gota que seja desse vinho sobre o meu equipamento!
Com isso ele se referia ao pequeno pad dourado que abrira sobre a mesa e no qual digitava alguns comandos. Talvez fosse um aparelho caro, difícil de repor ali em Carsis, mas a violência com que o homem falara endureceu as feições de Elyssa. Ela não ia deixar por isso mesmo.

(continua...)


Parte 2