domingo, março 15, 2009

Em Busca da Fonte

Pessoas queridas,

É verdade, faz tempo que não posto aqui, ao passo que a escrita ficcional vai se arrastando num lento e penoso processo. É como a subida de uma trilha íngreme, que demanda mais esforço do que o normal porque você está fora de forma, mas que ainda assim vale a pena vencer. Pela paisagem e pela sensação de plenitude no final.

A trilha é longa e não tenho muito fôlego, mas tenho companhia, principalmente o incentivo que me dão as palavras de mulheres como eu. São escritoras que precisam conciliar as dores e delícias do ofício com aquelas que provêm de suas vidas pessoais: os amores, os filhos, a necessidade de estar ao mesmo tempo em vários lugares e desempenhar tarefas as mais diversas. Além disso, existem as dúvidas, a inquietude tão comum a todas nós e os bloqueios que, vez por outra, nos travam a mente e a mão – e se tudo isso transparece nas entrelinhas dos contos e novelas, a confissão é clara e completa quando se trata de escritos autobiográficos.

Dentre os muitos que li, há três de que gostei especialmente, e dos quais costumo me lembrar quando me faltam o ânimo e a coragem. Os livros não estão à mão, mas aqui vão as idéias centrais, ou pelo menos aquelas com que me identifico... e que me fazem saber que não estou só.

O primeiro depoimento é de Doris Lessing, cuja autobiografia em dois volumes – Andando na Sombra e Debaixo da Minha Pele cobre várias décadas de uma vida dedicada à literatura e ao ativismo político. Num deles – o segundo, possivelmente, pois ela então já era uma autora consagrada – Doris aconselha aos escritores que “jamais procurem a aprovação de um crítico” para seus originais; que um amigo bem-intencionado é uma escolha muito melhor, simplesmente porque se importa com os sentimentos do escritor acerca do valor de seu trabalho. Ou pelo menos foi o que li nas entrelinhas. De qualquer forma, esse é um conselho que eu tento seguir, especialmente porque tenho a sorte de ter amigos que gostam de Literatura... e que, embora possam apontar uns defeitos aqui e ali, quase sempre conseguem me assegurar de que estou contando uma boa história.

E se eu sinto que a história não é tão boa? Nesse caso, recorro a outra escritora: Amy Tan, que em O Oposto do Destino fala francamente sobre os seus "maus começos". Entre seus vários romances de sucesso ela iniciou a escrita de outros tantos, às vezes avançando por dezenas de páginas que, depois, não teve como aproveitar. Reconhecer a fragilidade de um trabalho, principalmente quando já adiantado, e começar do zero são dois atos de coragem, mas necessários ao ofício de escritor – e se uma autora tarimbada como Tan passa por eles, por que não eu?

Agora, uma citação que vem de leitura recente: A Soma dos Dias, uma espécie de segunda autobiografia de Isabel Allende, na qual conta o que aconteceu a ela e a sua extensa família após a morte de Paula. Allende é uma espécie de Mãe-Terra que, tanto quanto em suas atividades literárias, tem que estar envolvida na vida familiar, e tanto se enredou no dia-a-dia que acabou por ver secar o poço da inspiração. Felizmente, foi passageiro - outros livros, inclusive sua impagável e folhetinesca leitura do Zorro, vieram após esse momento - mas ler sobre isso me despertou para o fato de que eu, também, tenho deixado a fonte secar mais do que é admissível, pelos deveres que preciso assumir - ou que assumo, desnecessariamente, por excesso de zelo, mas isso é o que menos importa. O importante é que percebi de repente o quanto minha vida estava se tornando árida, rotineira, desprovida de Magia, mesmo aquela que se encontra nas pequenas coisas. Sem Magia é impossível escrever - e é por isso que estou aqui, tentando fazer com que as fontes voltem a fluir como antes. Não é fácil, mas no fim acho que consigo.

Vocês esperam por mim?