quinta-feira, maio 14, 2020

Na Mesa do Escritor : Coluna no Blog Ficções Humanas

Pessoas Queridas,

Venho contar pra vocês uma novidade muito legal: estou responsável por uma coluna do blog Ficções Humanas, aquele das resenhas e dicas literárias incríveis!


O convite foi feito pelo Paulo Vinícius, e a ideia é compartilhar um pouco da minha experiência como escritora e organizadora de coletâneas. Os assuntos serão os mais variados, indo desde a construção de mundos e personagens até questões ligadas ao mundo editorial.

Os dois primeiros artigos já foram publicados, e vocês podem conferi-los aqui:


Apresentação

Essa Tal de Pesquisa


Espero que vocês passem por lá, deixem comentários e sugestões para textos futuros. Vou adorar!

E fiquem com a famosa "mensagem que eu deixo para meus leitores"...



Até breve, aqui ou no blog Ficções!

sábado, maio 09, 2020

Das Páginas Perdidas de um Bestiário



A criatura nasce em cativeiro, numa jaula de ossos. Dentro desta, para alimentá-la, um coração, do qual irá começar por roer as beiradas, e que, se for frio e consistente o bastante, irá bastar até que chegue à maturidade. Ali ela crescerá, de preferência em segredo: os criadores que deixam seus espécimes à mostra têm menos chances de sucesso. Sabendo disso, a maior parte deles escolhe o anonimato, acabando por se converter em seres tão sombrios e ensimesmados quanto suas criaturas.
O escuro é preferível, assim como o silêncio. Luz e alegria tendem a irritar e inibir os pequenos seres, embora, à medida que crescem, eles se tornem mais resistentes. Perto da idade adulta, já não importa se contam ou não com um ambiente tranquilo, prosperam ainda que em meio à algazarra e ao entusiasmo, e alguns são capazes de coexistir até mesmo com a felicidade. Para que isso aconteça, basta garantir que já tenham devorado a maior parte do coração, e é ainda melhor que tenham se aninhado em seu interior, garantindo o fluxo contínuo de sangue para o interior de suas próprias artérias. Quando isso chega a acontecer, pode-se ter certeza de se haver atingido o sucesso: consumido o coração hospedeiro, em pouco tempo a criatura romperá com garras e dentes a jaula de ossos e se lançará sobre o inimigo.
Então, tudo pode acontecer. Talvez o contendor seja destruído, talvez apenas ferido; talvez saia incólume, cantarolando uma canção pelas estradas enquanto a criatura agoniza em meio ao sofrimento de seu criador. Este é sempre quem recebe o dano maior, razão pela qual não compreendo como pode haver demanda. O sacrifício me parece grande demais, sem que se tenha, ao menos, garantia do resultado.
E, ainda assim, cada vez mais pessoas se esgueiram pelas ruas, braços cruzados sobre o peito, acalentando o ódio que aos poucos lhes devora o coração.

***

Imagem: reprodução de manuscrito de Leonardo da Vinci