terça-feira, setembro 17, 2013

A Floresta: um Poema de Gibran


Pessoas queridas,

Fosse vivo, o maior mestre que tive na vida e na arte de contar histórias faria hoje 107 anos. Já lhe dediquei livro e contos, já poemei aqui, já partilhei e passei adiante muito do que aprendi com ele, mas a saudade sempre permanece. Não como dor, felizmente: é preciso saber superar. Mas como querer bem e vontade de nunca esquecer.

Se vocês clicaram no link acima viram que eu não estou falando de Gibran. Mas o escritor foi um grande mestre, e libanês como meu bisavô, pai de Jorge, que aqui chegou como mascate e que também se chamava Khalil.

Então, em homenagem a essas raízes que temos em comum, deixo aqui um de meus poemas favoritos de Gibran. E um que afirma muitas das coisas que aprendi com meu avô.

Na Floresta

Na floresta não existe nem rebanho, nem pastor
Quando o inverno caminha, segue seu distinto curso, como faz a primavera
Os homens nasceram escravos daquele que repudia a submissão
Se ele um dia se levanta, lhes indica o caminho, com ele caminharão.
Dá-me a flauta e canta!
O canto é o pasto das mentes,
e o lamento da flauta perdura mais que rebanho e pastor

Na floresta não existe ignorante ou sábio
Quando os ramos se agitam, a ninguém reverenciam
O saber humano é ilusório como a cerração dos campos
que se esvai quando o sol se levanta no horizonte.
Dá-me a flauta e canta!
O canto é o melhor saber,
e o lamento da flauta sobrevive ao cintilar das estrelas

Na floresta só existe lembrança dos amorosos
Os que dominaram o mundo e oprimiram e conquistaram,
seus nomes são como letras dos nomes dos criminosos
Conquistador entre nós é aquele que sabe amar
Dá-me a flauta e canta!
E esquece a injustiça do opressor
Pois o lírio é uma taça para o orvalho e não para o sangue.

Na floresta não há crítico nem censor
Se as gazelas se perturbam quando avistam o companheiro,
a águia não diz: ‘Que estranho’
Sábio entre nós é aquele que julga estranho
apenas o que é estranho.
Ah, dá-me a flauta e canta!
O canto é a melhor loucura
e o lamento da flauta sobrevive aos ponderados e aos racionais.

Na floresta não existem homens livres ou escravos
Todas as glórias são vãs como borbulhas na água
Quando a amendoeira lança suas flores sobre o espinheiro,
não diz: ‘Ele é desprezível e eu sou um grande senhor’
Dá-me a flauta e canta!
Que o canto é glória autêntica,
e o lamento da flauta sobrevive ao nobre e ao vil.

Na floresta não existe fortaleza ou fragilidade
Quando o leão ruge não dizem: ‘Ele é temível’
A vontade humana é apenas uma sombra que vagueia no espaço do pensamento,
e o direito dos homens fenece como folhas de outono
Dá-me a flauta e canta!
O canto é a força do espírito,
e o lamento da flauta sobrevive ao apagamento dos sóis.

Na floresta não há morte nem apuros
A alegria não morre quando se vai a primavera
O pavor da morte é uma quimera que se insinua no coração
Pois quem vive uma primavera é como se houvesse vivido séculos
Dá-me a flauta e canta!
O canto é o segredo da vida eterna,
e o lamento da flauta permanecerá após findar-se a existência.

Um comentário:

Tânia Souza disse...

Esse poema é lindo demais, e a forma como nos apresenta deixou mais belo ainda.